Ernesto Neto, um dos mais internacionais e conhecidos artistas brasileiros, apresenta uma instalação imersiva, que evoca o cruzamento de culturas entre os diferentes continentes.
Com curadoria de Jacopo Crivelli Visconti, Nosso Barco Tambor Terra é uma das maiores esculturas realizadas, até hoje, por Ernesto Neto. A sua forma foi-se definindo ao longo de meses de trabalho, em diálogo com o espaço arquitetónico do MAAT e com o entorno do museu, extremamente denso de um ponto de vista histórico e simbólico, por representar o ponto de partida das caravelas que rumaram para o lugar que depois viria a ser chamado de Américas.
Partindo de imagens (velas) e materiais (lonas e cordas) geralmente associadas às viagens transatlânticas, o artista cria um conjunto de instalações inéditas que ocupam as várias dimensões do espaço. Para a criação da obra, foi utilizada principalmente chita, um tecido de algodão relativamente barato e extremamente difuso no Brasil que geralmente é decorado com estampas de cores fortes que representam flores e plantas. Esse tecido foi cortado em tiras e crochetado à mão por vários colaboradores, a partir de uma técnica desenvolvida ao longo de anos no ateliê do artista no Rio de Janeiro: o atelienave; e, com o material assim obtido, foram realizadas as células que, juntas, compõem a escultura. O plano geral da obra é desenvolvido à mão livre, através de testes e ajustes, e com a ajuda de softwares específicos, de maneira a ficar preciso, mas também maleável o suficiente para se adaptar às especificidades do espaço, quando da montagem in situ.
Nos últimos anos, à margem da sua atividade como artista, Neto tem se dedicado à percussão. Ao longo da exposição, a escultura, que incorpora uma série de instrumentos, será periodicamente ativada por uma programação musical, a cargo de músicos e grupos de vários lugares do mundo, com atenção especial para os ritmos das diásporas africana e asiática. Simbolicamente, o encontro de ritmos e batidas em Nosso Barco Tambor Terra irá constituir um contraponto à multitude de idiomas falados pelo mundo, aludindo à possibilidade de encontrarmos, em momentos e contextos específicos, línguas comuns que permitam uma comunicação que transcende a verbal e possibilita encontros autênticos e profundos. Coerentemente com o desejo do artista de criar uma obra autenticamente coletiva e diversa, os tambores de vários tipos e proveniências que habitam a instalação podem também ser tocados pelo público que visita a exposição.
Visitas orientadas
Todos os dias, com exceção das terças-feiras: 13.00 e 16.00
[Visitas gratuitas mediante apresentação de bilhete de entrada no museu.]
Tema gravado por ocasião da exposição "Nosso Barco Tambor Terra" de Ernesto Neto no MAAT – Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia, Lisboa.
A arte contemporosa
Texto de Ernesto Neto
Ela quer ir além da superfície, além do liso, do significante e do significado, ela quer estar dentro do corpo, unindo corpo físico, mental, espiritual e ancestral, ela quer transparência e materialidade, união do diverso, ela é naturalmente relacional, simbiótica, mutualista, multinatural. Acredita na sabedoria dos dedos, quer tocar e ser tocada, trocar, sentir pelos poros. Desconfia das culturas que se acham superiores à natureza, para ela a natureza somos nós também, respeita as fragilidades, expõe as tensões, mas respeita os limites, quer tocar o mundo com cuidado, atenção e amor. Sabe que a poesia está aqui, agora no canto silencioso de nosso respirar e expirar, que o sorriso é nossa conexão com o estar de bem, no tempo entre o céu e a terra. A arte contemporosa é amiga da jiboia, da serpente e da cundaline, sabe que a luz vibra em ondas assim como em pacotes de energia e que as duas coisas não são excludentes, pelo contrário, são complementares, yin e yang, ao mesmo tempo. Estuda a continuidade entre os corpos, entre mente, mão e terra, vê o planeta terra como corpo, não como paisagem, se vê como parte do corpo da terra, assim como parte de todo o universo, ou seria melhor dizer de todo o multiverso? Se preocupa com a devoção contemporânea ao mundo dos objetos, embora também os utilize, sabe que eles são a expressão marcante do estar humano, e sabe que eles, apesar de sua artificialidade, também são natureza, que, além de toda a matéria de que eles são feitos, toda a ciência aplicada no desenvolvimento deles, inclusive da vedete IA, tudo é natureza, não existe nada fora dela. A arte contemporosa se vê amorosa, louva a força vibrante de tambor, caxixi, flauta, violão, maracá, no canto e no cantar, aprendendo desde criança que alegria é cura. Ela preza o equilíbrio social, ninguém é maior que a natureza assim como ninguém é maior que ninguém, todos temos nossa contribuição a dar, Nosso Barco Humanidade Planeta Terra precisa de todo mundo: nós, insetos, abelhas, plantas, arvores, bichos, fungos, liquens, bactérias... como numa batucada precisamos estar todos juntos, no mesmo tempo, Umbuntu, nem na frente nem atrás, existe espaço para cada um ter sua expressão individual, mas entre o começo e o fim de cada ciclo todos temos que estar juntos para que o balanço e o brilho de todos dê espaço para o brilho, o transe e o bem-estar de cada um.
Mecenas MAAT e da exposição:
Apoio:
Margão
Fotografia: Bruno Lopes
Fotografia: Bruno Lopes
Fotografia: Bruno Lopes
Fotografia: Bruno Lopes
Fotografia: Bruno Lopes
Fotografia: Bruno Lopes