O direito à preguiça
Priscila Fernandes (n. 1981) tem-se concentrado na investigação, exploração e articulação de uma multiplicidade de dados relacionados com as práticas que nos definem, para além de sapiens (sapiente) e faber (fabricante), como homo ludens (lúdico): o que joga, o que brinca, o que busca nisso prazer.
A artista procura nos mecanismos de pensamento das crianças – através da associação livre, da indistinção entre humano e animal, animal e vegetal, animado e inanimado, por exemplo – as soluções para a construção das suas fábulas críticas.
Século e meio depois de Paul Lafargue, publicar “O Direito à Preguiça” no jornal socialista francês L’Égalité, as sociedades liberais falam da “semana dos quatro dias”, mas os ócios são afinal negócios (novas formas de trabalho que encontram expressão no irónico oxímoro “ocupação dos tempos livres”), pressupõem desemprego em massa ou são suportados pela sobrecarga de trabalho da restante Humanidade.
Os dois vídeos que aqui se apresentam são longas narrações derivativas, supostos episódios de uma série televisiva para os quais, entre rodas gigantes e aviões, montanhas-russas e baloiços, numa permanente desconstrução da seriedade que colocamos no trabalho, na arte e nas frases que usamos para gerir e mesmo pensar criticamente tudo isso, a artista convoca personagens como Cesariny, Duchamp, Mondrian, Buren…
Apresentadas em simultâneo com a exposição O Castelo Surrealista de Mário Cesariny, estas duas fábulas/rábulas artístico-críticas abrem as portas do sonho e da livre associação que o surrealismo prezava enquanto portas para a Liberdade.
João Pinharanda
Curador